O domingo parecia ter sido desenhado para o cruzeirense. Céu azul,
rostos azuis, cabelos azuis, camisas azuis que fizeram correr mais forte
o sangue azul e pulsar mais rápido os corações azuis de milhões de
pessoas. Belo Horizonte amanheceu eufórica. Buzinas e fogos de artifício
ecoavam. Só se esqueceram de convidar o Atlético-PR para a festa. O
Cruzeiro venceu o Grêmio por 3 a 0, porém o Furacão bateu o São Paulo
pelo mesmo placar e adiou a oficialização do tricampeonato. Mas não
adiou a festa. Deixou a Raposa 99,99...% campeã. Futebol não é
matemática, números não têm emoção e não compreendem a energia trocada
entre torcedores e jogadores no Mineirão. Eles sabiam que era a única
chance de sacramentar o título em casa, já que os próximos três jogos
serão longe: Salvador, Uberlândia e Rio de Janeiro.
Por isso, deram de ombros para o resultado de Curitiba e festejaram
como se o time já fosse tri, com volta olímpica. Atletas abanando as
camisas ao som do povo, numa despedida épica de um campeonato que alguns
chamaram de “sem graça”. Só se for para os rivais.
Como se esses jogadores, em quem pouco se apostava no início do
campeonato, já estivessem na galeria de heróis ao lado de Tostão, Alex e
companhia. Basta à Raposa vencer o Vitória, na próxima quarta-feira, às
21h50m, no Barradão. Se empatar ou perder, só não levanta a taça se o
Atlético-PR derrotar o Criciúma, fora de casa, também na quarta, às 21h.
Se os atletas são obrigados a esperar para gritarem “é campeão” sem
nenhum pudor, a torcida fez isso desde a chegada do ônibus do time ao
Mineirão, em meio a um mar evidentemente azul. O povo riu à toa, bateu
palmas para ex-jogadores como Sorín, Ricardinho e até Dida, que defendeu
o rival Grêmio. Mesmo assim, foi ovacionado.
- A torcida merece, está de parabéns. Temos 99% de chances de sermos
campeões. É extraordinário. Ganhamos de todas as equipes, respeitando
todas as equipes. Vamos fazer de tudo para sermos campeões no próximo
jogo - afirmou o atacante Ricardo Goulart, autor do terceiro gol.
Assim como outro goleiro. Fábio parou o Tricolor Gaúcho no segundo
tempo. Garantiu a grande vitória, que teve o dedo de Marcelo Oliveira e
os talentosos pés de jogadores que se encaixaram num quebra-cabeça quase
perfeito.
- Não jogamos mal. Criamos, mas o Fábio esteve muito bem. Tentamos de
tudo, mas paramos no Fábio. O pior seria se não tivéssemos criado -
disse o técnico gremista, Renato Gaúcho.
O Grêmio, que só disputou 45 minutos em bom nível, vê a vaga na
Libertadores cada vez mais ameaçada por Goiás e Vitória. Na quarta, os
gaúchos vão enfrentar o Vasco em Porto Alegre.
Dupla campeã
Dagoberto está prestes a ganhar seu quarto título brasileiro. Borges
vai para o terceiro, todos ao lado do companheiro. Parece que título
atrai título. Jogadores com o carimbo de campeão cravado no corpo e na
alma, decisivos. Foram eles os protagonistas do primeiro tempo. Na
esquerda, Dagoberto deitou e rolou em cima de Werley e Pará, com direito
a uma linda caneta no lateral. Ele ditou o ritmo do envolvente ataque
do Cruzeiro, que tinha Borges à espreita, à espera de uma bola. Ou de
duas... Na primeira, após chute de Everton Ribeiro, ele furou.
A segunda bola passou pela cabeça do parceiro. De Dagoberto para Borges
executar um movimento indescritível. Sabe-se lá se bicicleta, voleio,
canelada artística... Tão diferente que o atacante bateu com a cabeça no
chão ao mesmo tempo em que Dida observou a bola morrer no fundo de sua
rede. Uma loucura azul no Mineirão, um passo enorme para o tri. Seja
quando for. A essa altura, o Atlético-PR já vencia o São Paulo por 2 a
0. O placar do estádio não anunciou os gols, mas hoje em dia, com
celulares, internet e afins, todos já sabiam.
O Grêmio se defendeu sem vergonha. Parece que até desaprendeu a atacar.
Com um meio nada criativo, dependeu de contra-ataques mal armados. Um
deles quase chegou aos pés de Pará, mas Fábio saiu de carrinho em seus
pés e fez vibrar Marcelo Oliveira. Do outro lado, Renato Gaúcho deu seu
show particular quando segurou Egídio, que havia saído de campo tentando
alcançar a bola. É como se o professor Portaluppi pedisse clemência:
"Joguem com dez, por favor...". Os dois riram, a torcida vaiou. Kleber,
marcado de perto por milhares de pessoas, levou seu quase obrigatório
cartão amarelo. E Wilson Luiz Seneme quase recebeu vermelho de Marcelo
Oliveira ao ignorar lance em que Éverton Ribeiro pediu pênalti. Foi o
último ato do primeiro tempo.
‘Tricampeão, tricampeão...’
Missões da etapa final: Marcelo Oliveira tinha de convencer os
jogadores a lutar pela vitória com a mesma gana, mesmo sabendo que
dificilmente dariam a volta olímpica. Renato Gaúcho precisava fazer o
Grêmio atacar. Os dois tiveram êxito. Só que, para azar do gremista,
havia um Fábio no caminho. Kleber chutou, Barcos chutou, Yuri Mamute
chutou... E Fábio espalmou, Fábio espalmou, Fábio espalmou! O argentino
ainda acertou a trave. Renato esbravejou, pulou, socou o banco de
reservas... E viu o Cruzeiro fazer o que seu time não soube.
Com Willian e Luan nos lugares de Dagoberto e Everton Ribeiro, o
Cruzeiro ficou renovado na frente. E no placar. Que estrela de Willian!
“Respeita o moço”, já pede a letra do Bigode Grosso. Tem que respeitar
mesmo. Entrou e fez o gol, na sobra, de pé esquerdo. Em meio a tanta
comemoração, é bom se lembrar e agradecer ao Metalist, que mandou o
atacante como parte do pagamento por Diego Souza.
A vitória do Atlético-PR já era inevitável em Curitiba, e a torcida
respondeu nas cadeiras do Mineirão: “tricampeão, tricampeão!”. Ricardo
Goulart, único do quarteto titular mantido em campo até o fim, fechou a
vitória. Prova cabal do dedo do treinador na grande vitória: um, dois,
três a zero. Um, dois, três títulos brasileiros: 1966, 2003 e 2013. É
questão de tempo. De pouquíssimo tempo.


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